Por DIEGO MÜLLER

sábado, 11 de fevereiro de 2012

“ O CHICO NO FANDANGO GAÚCHO “


“ O CHICO NO FANDANGO GAÚCHO “ 


Um tema e duas danças : 
“Chico-do-porrete” e 
“Chico sapateado” 

J. C. Paixão Cortes 


Quando em 1950 subimos os Campos de Cima da Serra para estudar o folclore dessa região do Estado, levávamos em nosso fichário de pesquisa, entre inúmeros nomes de danças que procurávamos, referências sobre uma, conhecida pelo nome de “Chico”. 

Não poderíamos imaginar que somente em 1961, após onze anos de ininterruptas investigações, nos fosse possível reconstituir dois motivos coreográficos e musicais, sob um mesmo tema. 

“O motivo do “Chico” aparece pela primeira vez na Gazeta de Porto Alegre”, nos afirma Augusto Meyer, em seu “Guia do Folclore Gaúcho”. Entre outras danças do antigo fandango gaúcho, vamos encontrar citado por Cezimbra Jacques e Coruja : “O Chico”, “Chico-puxado” e o “Chico de roda”. 



Mas o motivo parece não ter sido bailado somente no Rio Grande do Sul. O grande folclorista Renato Almeida inclui o “Nho Chico” entre as danças do fandango paranaense. Alceu Maynard de Araújo que acaba de publicar Folclore Nacional, talvez o melhor conjunto de estudos e documentário sobre o folclore brasileiro, já descreveu um “Chico” que assistiu em Cananéia. 

Quando realizamos os nossos estudos bibliográficos sobre o assunto, nos chegou as mãos uma edição – de tiragem limitada – referente aos “Discos gravados no Estado do Rio Grande do Sul” (janeiro de 1946) através de pesquisas realizadas pelo musicólogo Luiz Heitor , que se fez acompanhar do professor conterrâneo Enio Freitas de Castro. No capitulo sobre as Danças do Fandango, vamos encontrar um registro feito em Pinhal, sobre um “Chico-troteado”. 


Nesse volume publicado pelo Centro de Pesquisas Folclóricas da Escola Nacional de Música da Universidade do Brasil, Dulce Martins Damas – que se incumbiu da publicação da referida obra e que também “fez os comentários de canto e danças do Estado do Rio Grande do Sul”, procurando analisar o “Chico-troteado”, transporta para a pauta, pela primeira vez em nossa literatura musical regional folclórica, o tema da referida dança. 
No entanto, até a presente data, nada se escreveu sobre a reconstituição coreográfica desse motivo. No presente artigo não cabe essa reconstituição com os mínimos detalhes – passos, ilustrações, partituras musicais, etc. – como o que fizemos em trabalho apresentado ao Congresso Tradicionalista de Taquara, e aprovado. 

Devemos dizer que pesquisamos dois motivos distintos, quer coreográficos, quer musicais, até aqui não registrados, e que advenham possivelmente , como os demais citados por outros autores, de um único tema : o “Chico”. 



“ CHICO-DO-PORRETE “ 

Junto com as danças Chula, dos Facões, e Fandango que recolhemos, o “Chico-do-porrete” constitui o quarteto de motivos coreográficos crioulos em que só participam homens. É uma dança de desafio, que exige muita resistência física e destreza. Assemelha-se não só neste sentido à Chula, como também porque existe uma figura comum a esta dança : aquela em que o bailarino dança por cima da vara ou porrete. No “Chico-do-porrete”, o executante só para de dançar, e entrega o porrete a outro, depois de fazer ininterruptamente todas as figuras que souber. 

(Os Provincianos - CTG Rancho da Saudade de cachoeirinha - 
Campeão danças Birivas Vacaria 2012)

A característica principal desta coreografia esta no movimento que o homem realiza com o bastão que deve ser de madeira leve. Geralmente é aproveitado um cabo de vassoura. Coreograficamente esta dança apresenta duas partes nos fandangos gaúchos de outrora, segundo nos “contaram” João Marciano dos Santos, Pedrinho Vieira e Domenciano Lopes de quem já nos referimentos são variados, cabendo a cada executante realizá-los de acordo como sua maior ou menor capacidade de improvisação e destreza, indo do simples cruzar de perna ao bate-pé e até mesmo aos sapateios mais floreados. Este movimento compreende duas fases : a) o avanço do dançarino de uma extremidade a outra do porrete; b) recuo (retorno) do dançarino a extremidade inicial, isto é, a posição anterior. Menos freqüente era no entanto, fazer-se meia-volta numa extremidade da aste e regressar de frente e não de costas, como anteriormente descrevemos. 

A seguir, o dançante abaixando-se toma novamente de uma das extremidades do porrete e continua passando o mesmo entre uma perna e a outra, como já foi dito. 

(CTG Brazão do Rio Grande - Grupo biriva Tranca-fio - Canoas/RS)


“ CHICO SAPATEADO OU CHIQUINHO “ 

Coreografia em que participa homem e mulher. Apresenta a característica curiosa de ser um motivo em que o par, ora se enlaça pelas mãos (semelhante aos tempos atuais), ora fica ligado somente pelos dedos, quando então dá-se o sapateio (bate-pé). Parece que podemos incluir este motivo como uma dança em fase de transição – dança de pares soltos e de pares enlaçados - assemelhando-se ao ciclo da Chimarrita Balão. 

(CTG Pampa do Rio Grande de Caxias do Sul - Campeão adulto de Vacaria 2012)

Sobre a música, temos a registrar em nossas pesquisas duas melodias, recolhidas do gaiteiro tradicionalista Pedrinho Vieira, do município de Lagoa Vermelha e João Marciano dos Santos, do município de Barracão, este último, além de cantar a melodia, executou a dança nos seus mínimos detalhes, inclusive sapateado. 

Em traços gerais, coreograficamente a dança apresente três partes : a) em que os pares enlaçados executam passos de polca, em liberdade de direção; b) em que os pares tomados somente pelas mãos, realizam giros a favor dos ponteiros do relógio e em sentido contrário, quando então sapateiam; c) movimentos em torno de si mesmo. 

Esses movimentos coreográficos correspondem a determinadas expressões musicais, escritas em compasso binário , de 2/4. 

(CTG Pampa do Rio Grande - Fernanda Antunes e Diego Müller - 
Chico Sapateado na Vacaria 2012)

Ao contrário do “Chico-do-porrete”, o Chiquinho é cantado. Das letras que recolhemos e das que foram publicadas, transcrevemos abaixo, as seguintes principais quadrinhas : 

“O Chico foi no poço 
Com uma pedra no pescoço 
Ninguém tenha dó do Chico 
Que ele morreu foi por seu gosto. 

O Chico caiu no poço 
Do fundo tirou areia 
Ninguém tenha dó do Chico 
Que está preso na cadeia. 

O Chico caiu no poço 
Com uma pedra no pescoço 
Não se importem com o Chico 
Que ele morreu foi por seu gosto. 

O Chico caiu no poço 
Não sei como não morreu 
Por ser devoto das almas 
Nossa Senhora o valeu. 

Eis em pinceladas rápidas como se “comportava” o Chico. 


Correio do Povo (Domingo) de 18 de abril de 1965. Páginas 36 e 27 

 - * - * - * - * - * - * - * - * - * -


" Não é um dever ser gaúcho... é um privilégio ser gaúcho!"
(Paixão Côrtes)


Nenhum comentário:

Postar um comentário