Por DIEGO MÜLLER

terça-feira, 3 de maio de 2011

Payada...

...Do Gaúcho à Dom Vicente


(Márcio Madalena - Osório/RS)
  
Meados de mil e quinhentos
Numa província da Espanha,
De Ronda o Mundo ganha
O pai de muitos talentos,
Afinal seus pensamentos
Viraram tinta em papel,
Assim se fez menestrel
Dessa forma de poesia,
Era a décima que nascia
De Dom Vicente Espinel!

Bendita seja a “Espinela”
Décima de Dom Vicente,
Quem ouve, conhece e sente
Sua estrutura tão bela,
Compreende a força dela
Que outra jamais vai ter,
É o sentir e o querer
Do poeta de mente rica,
Que em dez versos se explica
Por sua forma de ser!

Um marco de trajetória:
O livro “Diversas Rimas”.
E uma das obras primas,
“Obregón”, a tua história.
O fruto de tua memória
Ao Novo Mundo se expande,
Sem que ninguém comande
Com forte auxílio dos anos
Talvez por alguns “hermanos”
Chegou até meu Rio Grande!

Aqui, Francisco Ferreira
Fez dela um manifesto,
Delfina Cunha, um protesto.
É a décima à nossa maneira,
Que não encontra barreira
Que não se faz pessimista
É trilha, caminho e pista
Pra o  poeta peregrino
Até o autor de nosso hino
Em vida foi decimista!

Se passam trezentos anos
Da data de tua morte,
E Deus clava a sorte
Nestes pagos campechanos,
Fortes ventos pampeanos
Atravessam rio e fronteira,
Abençoando a parteira
Que trouxe à este plano,
Um tal Jayme Caetano
Na querência missioneira!

E ele se cria aragano
Pajando por todos cantos,
Conhece Sandálio Santos
O “payador” castelhano,
Que mostra à Jayme Caetano
O seu talento em pajada,
Segue então esta estrada
Na qual veio a crescer,
Pra o gaúcho conhecer
A “Espinela” improvisada!

Jayme então é aclamado
Por toda a nossa terra,
Um decimista de guerra
Que conquista seu reinado,
Tem no verso improvisado
Toda sua sabedoria,
Destreza e galhardia,
Qual manada de capincho,
Por eternizar num “Bochincho”
Seu estilo de poesia!

Cantamos felicidade,
Improvisamos tristeza,
Exaltamos a beleza,
Com muita cordialidade,
Por ter a genialidade
De um passado gaudério.
E no campeiro critério
Da milonga guitarreada,
A décima virou pajada
Neste garrão de hemisfério!

Fica o agradecimento
Deste gaúcho contente
Obrigado Dom Vicente
Pela “base” do talento,
Estrofe de fundamento
Merece ser exaltada
E por ser abagualada
“Rebenta” qualquer cancela,
Sendo o pai da “Espinela”
És padrinho da pajada!

(Jayme Caetano Braun - Bochincho)

Vicente Espinel Gómez Adorno
(1550 – 1624)

Poeta, novelista, músico, nascido em Ronda, província de Málaga, criador da décima espinela, um tipo de composição poética espanhola com estrofes de dez versos octassílabos . Dedicou-se à literatura, e obteve muito sucesso como poeta e como músico. Iniciou com o volume poético Diversas rimas (1591), mas consagrando-se definitivamente com o romance de aventuras com fundo autobiográfico, Relaciones de la vida del escudero Marcos de Obregón (1618).

Décima Espinela no Período Farroupilha

Uma das constatações da existência da décima no período da República Rio-grandense é a obra da decimista gaúcha Delfina Benigna da Cunha. Natural de São José do Norte (17.06.1791 - 13.04.1857), ficou cega aos vinte meses de vida, mesmo assim produziu obra importante. Seu primeiro livro Poesias Oferecidas às Senhoras Rio-grandenses, editado em 1843, registra esta décima que demonstra oposição ao movimento revolucionário, tanto que denuncia uma forte aversão ao General Bento Gonçalves da Silva.

"Chovam sobre ti os raios
Da Divina Providência
E seja tua existência
Passada em frios desmaios;
Nos mais cruentos ensaios
Sempre esteja engolfado,
Por querer do ímpio fado
Todos os males te assaltem
Té que os alentos te faltem
Bento infeliz, desvairado." 
.................


Segundo o sociólogo, bacharel em direito, musicista, historiador, biógrafo e autor de diversas obras, Fernando Osório, há décimas no período da Revolução Farroupilha, no Estado. No seu livro A Graça e o Lyrysmo-Heróico dos Farrapos, Osório registra que em 1834, o mártir revolucionário Francisco Xavier Ferreira, que morre no cárcere, registra em décima seu ideal: 

"Dos decretos de Minerva
A prol do grande Brasil,
Receia o bando servil, 
Já treme a facção proterva,
Embora infame caterva
Trace planos atrevidos
Serão logo desmentidos
Êsses planos ignavos
Pelos que não são escravos
De Braga e Barreto unidos." 

Outra comprovação da existência da décima espinela no Decênio Farroupilha feita pelo mesmo historiador na referida obra, elucida o autor da letra do Hino Rio-grandense como decimista. Afirma Osório: "Nascido no Alegrete, Francisco Pinto da Fontoura, passara dos braços de sua mãe aos de uma senhora que, como tal, o criou. Já adolescente e dotado de uma grande beleza, viveu separado desta dama por alguns anos, e, quando retornou à sua presença, era mui outro: Como está velho, o meu Chico! disse-lhe ela, entristecida sem poder ocultar a surpresa. Fontoura, horas depois fixou êsse encontro em doce lirismo: 

"... Na primavera da vida,
Quando estes versos tracei, 
Analia, nunca pensei,
Que a sorte me fosse infida
Esta barba encanecida,
Não é, Analia, dos anos,
É dos tristes desenganos;
São lembranças do passado
Do tempo em que, afortunado,
Eu era a flor dos humanos.


- X - X - X - X - X -


"Em minha busca de respostas para a pergunta da vida, senti-me exatamente como um homem perdido em uma floresta."
( Leon Tolstoi )

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