Por DIEGO MÜLLER

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Um dia a gente aprende...

...Um dia a gente aprende que...


...Depois de algum tempo você aprende a diferença, a sutil diferença, entre dar a mão e acorrentar uma alma.

E você aprende que amar não significa apoiar-se, que companhia nem sempre significa segurança, e começa a aprender que beijos não são contratos, e que presentes não são promessas.

Começa a aceitar suas derrotas com a cabeça erguida e olhos adiante, com a graça de um adulto e não com a tristeza de uma criança; aprende a construir todas as suas estradas no hoje, porque o terreno do amanhã é incerto demais para os planos, e o futuro tem o costume de cair em meio ao vão.

Depois de um tempo você aprende que o sol queima se ficar exposto por muito tempo, e aprende que não importa o quanto você se importe, algumas pessoas simplesmente não se importam... aceita que não importa quão boa seja uma pessoa, ela vai ferí-lo de vez em quando e você precisa perdoá-la por isso.

Aprende que falar pode aliviar dores emocionais, e descobre que se leva anos para se construir confiança e apenas segundos para destruí-la, e que você pode fazer coisas em um instante, das quais se arrependerá pelo resto da vida; aprende que verdadeiras amizades continuam a crescer mesmo a longas distâncias, e o que importa não é o que você tem na vida, mas quem você tem na vida, e que bons amigos são a família que nos permitiram escolher.

Aprende que não temos que mudar de amigos se compreendemos que eles mudam; percebe que seu melhor amigo e você podem fazer qualquer coisa, ou nada, e terem bons momentos juntos.

Descobre que as pessoas com quem você mais se importa na vida são tomadas de você muito depressa, por isso sempre devemos deixar as pessoas que amamos com palavras amorosas; pode ser a última vez que as vejamos.

Aprende que as circunstâncias e os ambientes tem influência sobre nós, mas nós somos responsáveis por nós mesmos.

Começa a aprender que não se deve compará-los com os outros, mas com o melhor que pode ser.

Descobre que se leva muito tempo para se tornar a pessoa que quer ser, e que o tempo é curto.

Aprende que não importa onde já chegou, mas onde se está indo, mas se você não sabe para onde está indo qualquer lugar serve.

Aprende que ou você controla seus atos ou eles o controlarão, e que ser flexível não significa ser fraco ou não ter personalidade, pois não importa quão delicada e frágil seja uma situação, sempre existem dois lados.

Aprende que heróis são pessoas que fizeram o que era necessário fazer, enfrentando as conseqüências. Aprende que paciência requer muita prática.

Descobre que algumas vezes a pessoa que você espera que o chute quando você cai é uma das poucas que o ajudam a levantar-se; aprende que maturidade tem mais a ver com os tipos de experiência que se teve e o que você aprendeu com elas do que com quantos aniversários você celebrou; aprende que há mais dos seus pais em você do que você supunha; aprende que nunca se deve dizer a uma criança que sonhos são bobagens; poucas coisas são tão humilhantes... e seria uma tragédia se ela acreditasse nisso.

Aprende que quando se está com raiva se tem o direito de estar com raiva, mas isso não te dá o direito de ser cruel.

Descobre que só porque alguém não o ama do jeito que você quer que ame não significa que esse alguém não o ama com tudo o que pode, pois existem pessoas que nos amam, mas simplesmente não sabem como demonstrar ou viver isso. Aprende que nem sempre é suficiente ser perdoado por alguém; algumas vezes você tem que aprender a perdoar-se a si mesmo.

Aprende que com a mesma severidade com que julga, você será em algum momento condenado.

Aprende que não importa em quantos pedaços seu coração foi partido, o mundo não pára para que você o conserte.

Aprende que o tempo não é algo que possa voltar para trás, portanto, plante seu jardim e decore sua alma ao invés de esperar que alguém lhe traga flores, e você aprende que realmente pode suportar... que realmente é forte e que pode ir muito mais longe depois de pensar que não se pode mais!!!

William Shakespeare

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NUMA CHEIA DO PANTANAL - Chamamé
L: Diego Müller e João Sampaio / M: Jorge Guedes

A brisa mato-grossense,
Neste entardecer bonito,
Assobia um chamamecito,
Tipo aqueles de encomenda...
Vem a cheia se alastrando,
Invadindo campo e estrada...
E se ouve o berro da boiada
Tranqueando em volta da fazenda!

Garças brancas e tajãs,
Voando na amplidão desnuda,
Sumindo se vão de muda
Ante os olhos do caboclo...
Os rios medonhos subindo
Vão transmutando a paragem,
Fazendo um mar na paisagem,
Que era descampado há pouco!!!

O meu chamamé se mescla
Com o som das violas do vento,
Chamameceando o sentimento
Que vem nas águas das cheias:
Dourado, pacú, piava,
A fauna de todo dia,
Vira um quadro de poesia
Pra quem traz terra nas veias!!!

É o barro às águas turvando
Entre o juncal e o capim...
Uma água suja sem fim
Quando a cheia acampa aqui...
A voz maviosa dos rios
Tem sotaque aváñe’é...
E até parece um chamamé
Lá do meu avô guarani!

Uma comitiva se vai,
Com um berrante em procissão...
O Pantanal é uma cerração
Com gris de céu pantaneiro...
Eu vou na culatra do gado...
Volto amanhã se Deus “quisé”,
Pra recorrer o “espinhé”
Que estendi lá no pesqueiro!!!

Aváñe’é: Idioma guarani.

(Encontro Internacional de Chamameceros)

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"Ser feliz não é uma fatalidade do destino, mas uma conquista de quem sabe viajar para dentro do seu próprio ser!"

segunda-feira, 25 de abril de 2011

A falta...


(Foto: Samir Lobo)


Encontro...
(Diego Müller)


Me peguei criando um encontro
Entre o meu olhar e o teu,
Recriando aquelas frases
Que o sentimento escreveu...
Me achei lembrando as cenas
Que pintaram vida em par,
Num passado tão distante
– Com vontades de voltar!

O tempo rasgou calendários...
O sentimento é este mesmo...
A noite me trouxe um sonho
Que não se achegou a esmo...
Se mudou, mudou por fora...
Aqui dentro é tudo igual...
– Voltei àqueles momentos
Da razão irracional!

A vida passa depressa...
Quero ver ela passar...!
...Me encontrei te reencontrando,
Com vontades de voltar...
Algo sente a tua falta...
Pode ser, talvez, fraqueza...
Mas, eu preso neste sonho
Será só minha a tristeza!

Sempre estive do seu lado,
E o que ficou vai ficar...
– Se um dia eu pensar em alguém
De você vou me lembrar...!
...Foi assim que me apeguei,
Recriando aquele olhar,
Que hoje chora tanta ausência,
Pra – só nela – te encontrar!!!

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“A coisa mais bela que o homem pode experimentar é o mistério. É esta a emoção fundamental que está na raiz de toda a ciência e arte.”

Sabimentos...

...que temos!



Sabimentos
(Diego Müller)

A alma de hoje se violou de querência:
Rolou pra fora num céu de afabilidades,
Santuarizando o sol – que vem galponeiro –
Querendo a vida musicada... por saudades!

Corda e madeira, de tons ancestralizados,
Coplando a sina que encerrou-se da lida...
E, agora – altiva – na noite que apertou nela,
Seduz o antes a recantar-se... por vida!

Pois somos ciclo – em milonga saudadera...
Pois somos volta – numa chamarra gaitada...
...Que este meu verso nem é meu, aparecido:
É voz arcaica, cimbrando o hoje... por nada!!!

– O vivencial afronta mesmo é na garganta,
Por que o lá fora se passa, e não faz amigos...
E o que há de adentro dulcifica os seus acenos
Pra, rima a rima, ofertar rastos... por antigo!

É a própria era na lingüística da noite:
Encantamentos ante o tom da corunilha,
Que toma estalos – estremecidos de alma –
Pra, assim – calmeira – trazer sua luz... por vigília!

...E eu sou ledor desses sabimentos de campo,
Tintando a voz com o que alcanço – sem se ver:
Antigamentos a humildar o próprio canto,
Porque ter pago é ser o simples... por saber!!!


(Farelo Lima, Diego Müller, Lenin Nunez e Tadeu Martins)

Já que voltamos da Barranca recarregados por energias todas positivas e sabendo que nossos rumos dentro da arte e da cultura estão corretos, venho aqui expressão minha gratidão e dedicação a um mestre da poesia e da arte que é Tadeu Martins. Grande parceiro Barranqueiro e amigo pra mates e charlas. O poema acima foi escrito em sua homenagem, com uma linguagem da qual ele domina, e eu fiz na "tentativa". 
Abraços Tadeu por essas experiências maravilhosas de convívio na Barranca. Pra ti "ermão"!


Seu crescimento na vida depende do carinho que dedicar aos jovens, da paciência com os velhos, da simpatia pelos adversários, da tolerância para os fracos e fortes. Porque um dia você vai estar em uma dessas situações.” 
 George Washington Carver

domingo, 24 de abril de 2011

40 anos de Barranca...

...e a volta de São Borja!

(Turma da "portelinha" com sua Sambarranca - Barranca zaramilhosa)

"Fruto da iniciativa de um grupo de amigos e artistas reunidos em torno do Grupo Amador de Arte Os Angueras, o festival junta todo ano algumas centenas de aficionados durante a Semana Santa às margens do Rio Uruguai, na divisa com a Argentina. Por três ou quatro dias, o acampamento a 13 quilômetros de São Borja é um palco ao ar livre para tertúlias musicais e poéticas, que culminam no Sábado de Aleluia com um concurso de canções cujo tema só é divulgado pela comissão julgadora na Sexta-Feira Santa - os compositores têm então 24 horas para escrever uma música e disputar o prêmio principal."
(extraído da matéria do grande parceiro barranqueiro Róger Lerina - jornal Zero Hora)


Não me recordo de quem é a frase (e talvez nem necessite ela de créditos, já que na Barrnca tudo que fizemos é incentivada inconscientemente pelos espíritos dos antigos barranqueiros que pairam na mágia do encontro):

"Em casa choramos normalmente de tristeza, e a Barranca nos permite chorar de emoção a cada breve momento!

(Foto de Boca Costa - Uruguaiana/RS - Nunca estamos sozinhos)

Essa é a frase que simplifica o encontro e resume sua Quadragésima edição... EMOÇÃO!!!! Pura emoção, a cada acorde, a cada canto, cada abraço, cada gole de trago, de vinho ou de mate! São muitos amigos revistos, muitos novos, muitos que a cada final de festa sentimos saudades! Não tem muito como explicar esse momento, tantos amigos e tanto convívio em pról apenas da amizade e da cultura (não apenas musical). Tive o prazer, inclusive, de acompanhar grandes amigos no palco do festival, e em breve colocarei os créditos dos campeões e dos autores do tema, do qual acompanhei também no palco! Saímos na foto! hehe!

(Foto de Emílio Pedroso - Zero Hora - POA/RS)

Abraços a alguns amigos com quem convivi mais no evento: Yuri, Glauco, Caio Martinez, Zinho, Érlon Péricles, Binho Pires, Tulio Urach, Tukano Netto, Zelito, Emílio, Telmo Motta Jr (e nossas fugidas pras festas da cidade), Luiz carlos Bremm (novo poeta), Nego Dorival, Nandico, Sérgio Rojas, Jorginho Freitas, Dr. Rogério, Cachoeira, turma da Portelinha, Cabo Déco, Os sobrinhos de Sepé, etc e etc... são muitos amigos!!! Pena a falta do meu "padrinho barranqueiro" Pedro Ortaça. Mas foi por uma boa causa!

Ah, e sem poder de deixar um beijo pra São-borgense, moradora de São Sebastião do Caí... a querida  Estéli carpes, parceira de Boitatá (valeu por ter ido) e pela festinha na UP!!! Beijos!!!

(Ônibus de ida, de Santo Ângelo, após o show, 
para São Borja, direto pra Barranca - Cantoria e boa charla sempre)

Então aqui, em fotos e alguns vídeos, um pouquinho apenas do que podemos apresentar deste baita evento!
Mais informações, na própria ZERO HORA amanhã (com matérias do Lerina e fotos do Emílio) e daqui a 15 dias, nos programas culturais da TVE!

(Tulio Urach, Diego Müller, Zelito Ramos e Cabo Déco - 
Tertúlia a luz de lampião, com samba às 5h da manhã)

Ano que vem estaremos de volta, se Deus quiser!

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De um pôr-de-sol guarany       
(Diego Müller)
Una irupé nada, com sua aura selvagem,
Numa paisagem prisioneira – ao pôr-de-sol...
E um índio crudo assobia um canto antigo
Num tom bonito, que se funde ao arrebol!

De selva e rio, é a natureza, tão minha:
Voz misionera – das três pátrias guaranys...
E a passarada faz dueto à minha cantiga,
Que por ser terra pinta estas cenas daqui!

Minha lanza de taquara vai de encontro ao acabuz,
Pois quem canta espalha estrela ante um tempo novo, sem luz...
Dançam valsas, pelas matas, pomberos – de alma caté...
Cenas que o progresso ataca... sem charla... e sem tererê!!!

Sou alma e dor nos limos que traz o Uruguay...
Tão sapucay a cortar lados do meu rio...
Mais que Argentina e Paraguay – eu sou o guairá,
Com tons avás nas plenitudes do Brasil!

Ruína e sonho numa ameríndia quimera,
Sobre un tapé, cruzando por lejos do pago...
Por eso mismo restou o meu chamamé índio
Pra – além do tempo – chorar feridas que trago!!!

Miro de novo às lonjuras, no pôr-de-sol que se enterra,
Que, entre as linhas da sua cena, mostra a força da minha terra...
– Pois meu povo é igual ao sol, na sua lição insistente:
Que, ao já darem por morto, renasce... bem mais brilhante!!!.

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"Sou como você me vê.
Posso ser leve como uma brisa ou forte como uma ventania,
Depende de quando e como você me vê passar."
Clarice Lispector

terça-feira, 19 de abril de 2011

Recesso...

...por um "Comício de Espíritos"!


Bom gurizada...

De hoje até domingo estamos de recesso, por um Comício de Espíritos.
Estamos nos dirigindo hoje, as 9h da manhã, para o Festival da barranca, do qual completa 40 anos!
Será mais uma pascoa maravilhosa ao lados de grandes amigos e companheiros de arte!
Lembrando que hoje a noite o Show é em Santo Ângelo e amanhã no Passo, em São Borja!
Então, que o Generoso nos acompanhe, e nos raga de volta!

Abraços do "ermão" de sempre e Feliz Pascoa a todos!!!!!!!!!!

...DIEGO MÜLLER!

(Gabriel "Selvage", Diego Müllr e Érlon Péricles)

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(Canto Missioneiro de São Sepé/2008 - Terceiro lugar e Mais popular)

Coração da minha gente
L: Diego Müller e João Smapaio
M: Érlon Péricles
I: Ângelo Franco (*com Érlon Péricles e Cristiano Quevedo)

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FLOR GUARANY... 
(Diego Müller & João Sampaio) 

Morena... Flor de uma raça 
– Estampa bugra dos sonhos – 
Que eu conheci numa taba, 
Num tempo lindo e risonho... 
Deusa nua das auroras, 
Com selva e mata nos lábios, 
Guardando um mel de mirim 
Na resteva dos ressábios... 

Morena... Guaranicera, 
Sou igual um tapekuê... 
Pra não esquecer teu nome 
Te chamo num chamamé... 
Saudade é magia índia 
No cio que tua alma sente, 
Por isso bebo em teu corpo 
Aromas de sanga em vertente!!! 

Morena... Potykuru: 
Corticeiras e perfumes... 
Teus olhos negros de noite 
Tem brilhos de vagalumes... 
Na sede dos teus cabelos 
A madrugada chorou 
E na pampa das tuas retinas 
Um céu de estrelas se apeou... 

Morena... Voz dos recuerdos 
– Chirua cunhatay – 
Orvalho tenho nos olhos, 
Chorando tempos por ti... 
Recordo a tarde trigueira 
Quando eu cantei só pra ti, 
Regando ausências ariscas... 
...Minha linda flor guarany! 

*Taba: (tava) Lugar dos índios. Morada indígena. 
*Guaranicera: Da raça guarany, do guarany. 
*Tapekuê: Estrada abandonada. 
*Potykuru: Botão de flor. 
*Cunhatay: Moça.


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Uma das mais belas lições que tenho aprendido com o sofrimento: Não julgar, definitivamente não julgar a quem quer que seja.” 
 (Chico Xavier)

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Armaduras...


Armaduras...       (Diego Müller)


Eu vesti minhas armaduras
Pra não receber teus risos...
...Tenho só as lembranças tantas:
Nada mais do que eu preciso...
– Por fora o bronze (das dores)
Que está envolto às fraquezas,
Que um dia pintaram cheias
Como a forçar correntezas!

Eu vesti minhas armaduras
Ante a vida que era a minha...
...Dor que eu tive, decidido,
Mesmo pr´uma alma sozinha...
– Por dentro a ferida (aberta)
Que não fecha aos sentimentos...
Mas debaixo à carapaça
É só meu o entendimento!

Eu vesti minhas armaduras
Fronte a um ciclo de ida e volta...
...Sonho errante, que te segue,
Quando das razões se solta...
– O tudo que achei (no nada),
Já que não mudei teu mundo...
...Alma rija – pedra e ferro –
Sobre um penar tão profundo!

Eu vesti minhas armaduras...
E não funcionou o encargo...
...Nem reparou pelo escuro
Que exteriorizado eu trago...
– Tomou um rumo (contrário)
Ao que cena tinha pra dar:
Nem tentou ver quanto é frágil
O que era só pra ultrapassar!!!

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(Vinicius de Moraes)

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Tudo o que somos é resultado do que pensamos!” 
 Buda

A viola...


...E sua importância no folclore gaúcho! 

(J. C. Paixão Cortes - Trabalho Apresentado pelo Dep. de Pesquisa e Divulgação do Folclore da Ordem dos Músicos do R.G.S.) 


Para quem ouve hoje em dia as programações gauchescas de nossas Rádios, assiste a execução de componentes de Centros de Tradições ou vê pela Televisão “shows” de artistas regionais, dificilmente será dado conceber que os instrumentos atuais sejam os mesmos daqueles que na aurora da música “campechana” acompanharam as vozes e os fandangos de “dantes”. Hoje em dia é difícil (ainda mais no nosso meio "festivaleiro" e "fonográfico", resumido à músicas e influências "de fronteira") escutarmos ou assimilarmos o uso da viola em nossa musicalidade, e do quando ela nos foi importante, e ainda é, se falarmos em FOLCLORE!



- A VIOLA - 

A viola é um instrumento cordófono, em que as cordas transmitem sua vibração ao ar. Chegou ao Brasil através dos portugueses, e parece ser remanescente da cultura mourisca, que deixou profundos sulcos na península ibérica. “O século do povoamento brasileiro, o século XVI, foi a época do esplendor da viola em Portugal, expresso nos autos de Gil Vicente e nos cancioneiros”. 

“No Brasil, em muitas regiões do nosso homem rural, continua a viola como o instrumento mais popular, não só para acompanhamento do canto, como também da dança. No entanto, ao aclimatar-se a viola em terras brasileiras, sofreu algumas modificações, não só na sua morfologia com o no número de cordas. É a lei da evolução. Evoluiu tanto, que nós conhecemos no Brasil, cinco tipos distintos de violas de corda de aço : a paulista, a cuiabana, a angrense, a goiana e a nordestina. 

Embora não tenhamos encontrado definição do vocábulo “viola” em nenhum dos Dicionários regionais gauchescos – antigos ou modernos – podemos dizer que no Rio Grande do Sul o reinado da viola como instrumento solista nos bailes de salão, nos fandangos batidos, entre os “tiradores” de Reis e cantadores de Quero-mana, em “aporfia e nas cantigas do Divino Espirito Santo, ultrapassou a guerra do Paraguai para ir desaparecer nos primórdios deste século, conjuntamente com as últimas manifestações das danças sapateadas e de par solto. O francês suíço Jean Charles Moré, que aqui chegou em 1841 e se estabeleceu com negócios, nos diz que “no campo rara é a casa em que não se encontra uma guitarra (viola).. Quase toda a família sabe tocar o instrumento e desse modo facilmente se improvisa uma dança peculiar na região, que só apresenta semelhança com as danças usadas em terras de Espanha. As melodias são muito simples e um tanto monótonas, mas atraentes e, dada a sua correlação com certos aspectos locais, gravam-se afinal na memória”. 

As mais vivas informações sobre esse instrumento nos levam a acreditar que, embora o original pudesse ter vindo com o colono açoriano, a popularização da viola, na então Província de São Pedro, deu-se pelos tropeiros paulistas através do famoso “corredor das tropas de mulas”. Os mais velhos violeiros que conhecemos viveram nos campos de Cima da Serra, Planalto Médio e Encosta da Serra do Mar, onde ainda hoje se evidencia a influência bandeirante na formação do então tipo do “biriva” riograndense. Aliás, o grande folclorista de São Paulo, Alceu Maynard de Araújo, nos dá um curioso informe, quando diz : “Trago para estas páginas o testemunho insuspeito de meu avô materno, Virgílio Maynard, tropeiro, que dos 12 aos 60 anos de idade, isto é, desde 1870 palmilhou as ínvias estradas do Rio Grande e São Paulo. Contava que nunca vira seus peões e camaradas viajarem sem suas violas, quase sempre conduzindo-as dentro de um saco, amarrado à garupa do seu animal vaqueano”. 

“Não havia, pouso em que, após o trabalho azafamado do dia, não tocassem, antes de dormir o sono reparador. Quando a zona era infestada por animais ferozes e havia necessidade de dormir com o fogo noite a dentro, o violeiro, ao interregno de lançar achas ao braseiro, plangia ... sua viola dolentemente”. 

Sinceramente, ainda não dispomos de elementos para saber se a guitarra espanhola teria contribuído com algo para o tipo da viola gaúcha. Nicolau Dreys (1818) e Ave Lallemant (1851) nos dão ciência de uma guitarra entre os nossos homens do campo, sem maiores esclarecimentos, bem como religiosos que viveram nas Missões Jesuíticas, como é o caso do Padre Gay. 

“Como relíquia se conserva na dita igreja uma bandeira do cabildo do povo da cruz que é o único dos povos jesuítas entre o Uruguay e o Paraná que conserva uma pequena povoação de índios, mas quando por circunstâncias nos domingos e dias de festas a pequena povoação de índios e mestiços enche a igreja, um jovem cristão guarani celebra o oficio de tarde e um índio dirige o coro que acompanham algumas guitarras, uma flauta e algumas violas”. 


Em nossas pesquisas, que se estenderam por Santa Catarina a dentro, encontramos, por esses rincões, recitativos e “ordens de comando”, na “Meia-Canha” (“Relacione”, também chamada) , como estas : 

“Para la guitarra 
Pra eu dizer minha relacion” 

Interrompia a música, e o dançarino recita : 

Eu dizer não digo 
E pedir não peço 
Siga la guitarra 
Já cantei meu verso. 

Em São Paulo, o folclorista José Nascimento de Almeida Prado, registra uma dança de nome "Guitarra”, levada pelos gaúchos, quando dos invernadeiros de tropas pelas mediações de Itaberá”. “Terminando o verso – descreve, num de seus trabalhos o citado folclorista – em regra acompanhando de grandes gargalhadas de todos, o improvisador virava-se para o tocador e dizia : “Siga la guitarra”; e a dança continuava, tocando a vez a outro, e ia repassando todos os que dançavam, podendo se quisesse qualquer fazer outros versos, sendo não raro uma coisa assim : “Pára la guitarra (como se dizia na repetição) pára la guitarra que ainda tenho o que dizê”; e não raro esgotava os versos ou embatucava , esquecia, e virando-se para o tocador , exclamava : “Siga la guitarra que eu tornei a se esquecê. E assim continuavam horas seguidas, debaixo de grande hilariedade”. 

(Viola caipira)

Esses registros chamam-nos a atenção. No entanto, nossas investigações de campo, nos levam a acreditar que a guitarra das bandas Cisplatinas ou mesmo a “viguela”, com que José Hernandes inicia seu celebre canto Martin Fierro, em nada , influiu no tipo da viola gaúcha. 

O Dr. Pedro Duval, ilustre professor de violão, profundo estudioso desse instrumento, nos prestou pessoalmente os preciosos esclarecimentos que seguem : “Pelo menos desde meados do século XV , viola foi sempre em Portugal a denominação corrente da “Guitarra Espanhola”. Em meados do século XVI já encontramos esse instrumento dotado de 5 pares ou ordens de cordas (com quanto ainda se os encontrassem de apenas quatro) e dez cravelhas. 

Subsiste assim ainda na segunda metade do século XVIII, quando sofre diversificada evolução : uma em Portugal, ao parecer por obra de Manoel da Paixão Ribeiro (Nova Arte da Viola, Coimbra, 1789), que lhe acrescentaria bordões (oitava grave) às ordens 4.a e 5.a triplicando-as, e desse modo ficando o instrumento dotado de doze cravelhas; e outra revelada nos tratados publicados em 1799 na Espanha, um dos quais de autoria de famoso mestre Português, e pelos quais se vê que o instrumento já está dotado de 6 ordens e apenas 11 cravelhas, devido a ser simples a primeira ordem (“Prima” corda mais aguda), como conseqüência – de aperfeiçoamento a que experiência conduziu. 


As cordas duplas eram afinadas ao uníssono, à execução da 6.a ordem, constituída de cordas de diferentes diâmetros, uma das quais afinava uma oitava mais grave do que a outra. 
Poucos anos depois, no inicio do século XIX, já se encontra esta viola de 6 cordas simples, e com a mesma afinação da anterior. Tendo vindo da França para Portugal, deu-se-lhe a denominação de “Viola Francesa” e por ser o instrumento de som mais grave e de maior tamanho do que as violas anteriormente conhecidas, chamaram-no os portugueses , de “Violão”. 

A chamada “vihuela de mano” não era mais do que a viola aristocrática, o instrumento dos músicos eruditos, que se tocava “ponteado”, isto é, nota por nota, e que teve pleno uso de meados do século XVI a meados do século XVII. Era maior do que a viola popular, chamada “Guitarra Espanhola”, possuía geralmente 6 ordens de cordas, das quais a “Prima” porém simples, verificando-se um total de 11 cravelhas. E notando-se também que eram usuais cordas de tripa nas três primeiras ordens, ao passo que na viola popular eram estas sempre metálicas”. 

A nossa viola parece ser herança deixada pelos bandeirantes, que quando chegaram ao Rio Grande, já traziam dois séculos e meio de Brasil-Colônia. 
Em nossos longos anos de pesquisa folclorica encontramos no Estado só 4 violas autenticamente antigas, pois, as que atualmente vem sendo usadas por duplas e trios em programas de rádio, palcos e picadeiros de circos, são de industrialização recente e feitas em série, por fábricas paulistas. 

As peças que conhecemos estão no Museu Ítalo Gauchesco Abramo Eberle, do Centro de Tradições Gaúchas Paixão Côrtes, de Caxias do Sul; com a então família Os Paulinos, em Bom Retiro (1956), no Museu da Sociedade dos Caixeiros Viajantes, em Santa Maria, (desapareceu) e uma em nosso poder, adquirida em 1951 do fazendeiro vacariano João do Moerão, (faleceu com mais de 90 anos de idade nos primeiros anos da década de 1960) e que ganhara de presente quando mocito de seu pai. 

(Almir Sater e Tião Carreiro)

A viola gaúcha, pelo que nos foi possível pesquisar, podemos defini-la como sendo menor do que o violão (mede em torno de 80 cm de comprimento) e com as seguintes características gerais : “Caixa de ressonância” – faz lembrar pelas dimensões e formato, os violões em voga, na França, ao tempo de Luiz XIV, sendo que a tampa da frente (tampo) pode ser lisa, com incrustações rústicas feitas a canivete e faca ou com aplicações de madeira, em alto relevo. Descansando sobre o tampo temos o cavalete de madeira, simples ou trabalhado. Paralelo ao cavalete está o rastilho. A tampa posterior ou “costa”, também assim chamada em São Paulo, geralmente é lisa e inteiriça, sendo que o aro (7,5 cm) pode receber incrustações ou não. A madeira desta parte deve ser fina e flexível para formar bem a “cintura da viola”. O tampo habitualmente é feito de pinho, podendo a “costa” ser também de cedro ou canela, segundo nos informou Santiago Dré, de 86 anos, morador do município de Barracão. 

A largura média do bojo na parte inferior é de 24 cm e a superior de 17 cm. O comprimento da caixa de ressonância anda ao redor de 38 cm. 
Tem uma “bôca” com 7 cm de diâmetro e seu formato é o de uma circunferência. Pode encontrar-se em seu redor, às vezes , incrustações simples, ou trabalhadas em madeira, com tonalidades distintas. 


O “braço” tem uma largura de 4,5 cm e um comprimento em torno de 43 cm sendo que destes, 22 cm correspondem às 10 ou 12 divisões ou “trastes” de metal, aplicados sobre o espelho, transversalmente. Nos restantes 21 cm estão distribuídas as “cravelhas” de madeira, em número de 10 a 12. Estas correspondem ao número de cordas da viola. O formato da parte a que nos referimos agora – os paulistas chamam de “palheta” – apresenta-se em mais de um modelo, sendo que às vezes vamos encontrar um orifício na parte superior que serve para pendurar a viola. 

“Cordas” – Conforme o número delas – 5 ou 6 - duplas classifica-se o instrumento em “meia viola” ou “viola inteira”, respectivamente. As cordas eram metálicas, aço ou latão – e vendiam-se em pequenos carretéis de madeira (possuímos mais de um), marcados com um número que correspondia à ordem de sua colocação na viola. Esta , ao ser guardada, deveria ser desafinada, a fim de que o encordoamento não viesse a prejudicar o instrumento, devido às variações de temperatura. 

São do nosso cancioneiro popular de outrora, as silvas que seguem : 

“Duas, cinco, oito, dez cordas 
Rebento desta viola, 
E continuo tocando 
Com o mesmo jeito pachola 

O tocador de viola 
Merecia um bom encosto, 
Uma galinha bem gorda 
E uma china de seu gosto 

A viola sem a prima 
A prima sem o bordão, 
Parece filho sem pai 
Ausente do seu irmão”. 

Quem sonar uma viola 
Bote nela sua atenção 
De pura alegria chora 
Se é tristeza, ri então. 

Tenho uma viola nova 
Que me dá o alimento, 
Com ela mato a saudade 
Quando tenho sentimento. 

O Padre José Luiz de Fraga, referindo-se ao folclore açoriano, registra dezenas de melodias, danças e quadrinhas, das quais extraímos : 

“A Virgem Nossa Senhora 
Vai pelo Mosteiro fora 
Em manguinhas de camisa 
Tocando numa viola 

A viola era de oiro 
As cordas de prata fina 
Dedos que nela tocavam 
Eram de glória divina 

A viola tem dez cordas 
Juntamente dois bordões 
E acima do cavalete 
Também tem dois corações” 

(Viola portuguesa)

As duas primeiras são “embalos” ou melhor, “cantigas de ninar”, e a última uma “chamarrita”. 
A viola e a rabeca eram outrora os companheiros inseparáveis do tambor nas “folias do Divino” como pesquisamos e como exemplifica Luiz Araújo Filho, em sua “As Recordações Gaúchas (1903) e citado por Augusto Meyer. 

Diz-se que entre as muitas “tiranas” que existem no período da Revolução Farroupilha – “tirana grande”, “tirana dos farrapos”, “tirana do ombro”, “tirana das coxilhas” – uma existiu, denominada de “tirana tremida” que assim era chamada devido a maneira particular do violeiro fazer vibrar (tremer) as cordas da viola. 

“Nessas diversas peças de música rústica, do fandango, formada das mais elementares combinações de sons, sobressaiam certas notas graves tão sublimes que testavam intensamente, umas o sentido de alegria, as outras a tristeza, a saudade de recordações longínquas, acompanhadas de certo abalo sentimental, muito principalmente no anú e na tirana, cujos sons melódicos da prima e da segunda corda da viola eram os mais tocantes. Se um hábil maestro se preocupasse a compor uma ópera com todos esses tipos musicais, isto é, as peças do fandango, sairia talvez a mais encantadora e a mais bela ópera da harmonia (Ensaio sobre os Costumes de Cezimbra Jacques, 1883). 

Era comum nos motivos do fandango, os violeiros “pontearem , isto é, tirar nota por nota das cordas da viola sendo comum o uso da unha do dedo polegar, fazendo as vezes da popular dedeira atual, essa melodia assim executada (cantilenas) era entre uma dança e outra, ou melhor, entre os sapateios. 

Aliás, nesta parte o ritmo também era cadenciado por bater de palmas, rufar de pés e tinir de esporas dos fandangueiros, como tivemos oportunidade de ver e gravar em Campo Bom. 

Comentando a partitura impressa da Dança da Tirana, no seu Anuário de 1903, Graciano Azambuja, entre outras coisas, nos deixa o seguinte, a respeito da referida música : “Os acompanhamentos são típicos, exatamente como são feitos ao violão ou à viola. Os acordes assinalados com uma pequena cruz significam as pancadas que todo o tocador gaúcho costuma dar no tampo superior do instrumento com as pontas dos dedos”. 

No Cancioneiro Guasca, de Simões Lopes Neto referindo-se o autor a dois modelos de desafios entre Malaquias e Agache, e Juquinha da Tapera e Chico Cigarra, este em “Descante à viola”, encontramos duas quadrinhas que nos parecem dizer também da modalidade de “rasgar” a viola : 

“Quero ainda experimentar-te; 
Se és cantador de talento 
Num rasgado da viola 
Me diz o que é casamento ?” 

“Como matungo de lei 
Posso ser, porem no pinho 
Pois num rasgado sou mestre 
E na trova ando sozinho” 

O toque rasgado - que eqüivaleria ou seria semelhante ao rasqueado espanhol – consistia em comprimir e arrastar com rapidez sobre as cordas a extremidade exterior dos dedos da mão direita. 
A viola era o instrumento principal da dança Fandango, sendo que a maneira rasgada de bater as notas para dar o ritmo desse tema coreografico, era importante para cadenciar o sapateio dos dançarinos gaúchos, como tivemos oportunidade de verificar nos registros sonoros que fizemos dessa dança. 

“Minha viola está dizendo 
Que a prima está com dor 
Minha gente venha ver 
a fama do tocador” 

(Orquestra de violas)

Acontecimento inédito nos dá Múcio Teixeira, em “Os Gaúchos” (1920) quando nos diz de celebre tocador de viola Vitorino Rascada, que os Presidentes da Província faziam questão de ouvir tocar, pois ia propositadamente rebentando, uma por uma, as cordas de seu maravilhoso instrumento, até que, só com a última executava então o Hino Nacional. 

Também sobre destacado violeiro, João Cezimbra Jacques (Ensaio sobre os Costumes do Rio Grande do Sul – 1883), nos dá este informe : “As diferentes peças eram tocadas na viola, da qual havia tão bons tocadores que tiravam notas de diversas cordas desse instrumento imitando choros, suspiros e gemidos, dentre os quais tocadores destacava-se Zeferino Rascada, que arrebentando as cordas, tocava só numa (a prima) , as peças que queria”. 

Ficamos em dúvida. Seria Zeferino o mesmo violeiro a que se refere o autor, anos mais tarde (1912) em seu Assuntos do Rio Grande do Sul, Página 28 ? ... “tivemos exímios tocadores como Victorino Rascada nesta capital e que muitas vezes dava tocatas no palácio presidencial, com brilhante sucesso”, Múcio Teixeira teria se baseado nesta ultima informação de Cezimbra Jacques ou conhecera realmente Victorino ? Perguntamos nos : Victorino seria irmão ou parente de Zeferino ? ou a mesma pessoa ? Rascada era sobrenome ou advinha de Rasgada, maneira de tirar notas da viola ? Não poderia ter havido erro de imprensa, trocando-se G e C ? 

Mas Cezimbra Jacques em “Assuntos do Rio Grande do Sul”, mais adiante acrescenta o nome de outros violeiros como : Bernardino Felix, em São Jerônimo; Silvio Cardoso, em Upamarotí; Felix Martins, em Uruguaiana e por uma fatal coincidência todos estes eram conhecidos pelo nome e um só sobrenome”, destacando entre as senhoras e senhoritas que cultivavam esse instrumento o nome de “D. Cândida de Azambuja, moradora não longe de Taquarí, próximo do lugar denominado Volta do Barreto. 

Quanto à afinação, o certo é que não temos a variedade encontrada nas violas do serra-a-cima paulista, em número de 16 “temperos”. 

(Chamamé de viola)

Não encontramos no Rio Grande do Sul nenhuma referência à superstição existente em São Paulo, entre violeiros ainda hoje, os quais não gostam de emprestar seu instrumento a outro tocador, pois pode ter ele mau olhado e destemperar a viola, sem jamais esta voltar à afinação desejada. 

Nem a crendice do uso no bojo do instrumento, de guizo de cascavel, galho de arruda, casca de guiné, para livrá-lo do quebranto. 

Sem outro maior significado, alguns violeiros atavam junto à parte correspondente às cravelhas, fitas de cores distintas, para maior embelezamento do instrumento. 

Quanto a maneira de empunhar a viola, poderíamos adotar a classificação ditada por Alceu Maynard de Araújo : posição religiosa e profana . A primeira , os tocadores com quem privamos sustentavam com o braço direito o “corpo” da viola, bem junto ao peito (parte superior do violeiro) e com a mão direita dedilhavam as cordas. A mão esquerda segurava o “braço” do instrumento. Não usavam cordões ou penduricalhos para sustentar o instrumento, não só quando estavam de pé, mas também quando tocavam e dançavam. Exemplo : Dança de São Gonçalo, que assistimos no Rincão da Mulada. Na posição profana o músico tocava geralmente sentado com o instrumento algo descansado no colo e com o braço da viola não muito inclinado para cima. 

(A viola e o Terno de Reis no RS)

Em seu livro “Revivendo o Passado”, Archymedes Fortini, referindo-se a uma colaboração recebido de José Maciel Júnior, escreve: “Quando deixou o governo desta antiga Província do Rio Grande do Sul, em 1855, o conselheiro João Lins Vieira Consensão de Senimbu, de regresso para o Rio de Janeiro, seguiu por terra até Santa Catarina, onde foi embarcar, evitando as dificuldades e perigos, então muito freqüentes, na barra do Rio Grande. 
De passagem pela então Vila de Santo Antônio da Patrulha, encontrou ali festiva e condigna recepção, sendo hospedado no Paço Municipal, onde lhe foi oferecido em esplendido baile, considerado o de maior pompa, até aquela época, na então Vila. 

A única música da Vila, e que serviu, consistia em duas violas, habilmente executadas por dois crioulos escravos, de nomes Clemente e Wenceslau, um alfaiate, outro pedreiro, os quais eram destros em pontear nesses tradicionais instrumentos, as músicas de danças modernas ainda em voga. 
O ilustre hóspede , sem quebra da circunspeção de seu caráter aristocrático, correspondeu fidalgamente às modestas homenagens da edilidade e da população, dançando sem dúvida pela primeira e última vez sob os acordes destes primitivos instrumentos populares da terra gaúcha”. 

Também Antônio Stenzel Filho, em sua descrição de “usos e costumes até 1872, em Conceição do Arroio”, nos fala da “carta e sua resposta “ que o mulato Manoel Justino trouxera da guerra do Paraguai e que cantava ao som da viola : 

“Cá por estes pagos 
Amigo teus versos li 
Quero tocar a viola 
Mas a toada perdi 
E de amor meio abombado 
Dessa tenção desisti”. 

Do teu tordilho tu choras 
A triste separação 
Pois estás no Paraguai 
Nesse maldito rincão 
Onde falta o churrasco 
E o mate chimarrão. 


Carlos Von Kozeritz em sua “Gazeta de Porto Alegre”, registrando em 28 de janeiro de 1880 silvas sobre o romance do Conde Alberto, faz as seguintes referências : “Não faltará quem estranhe ver ocupada parte de nossas colunas por uma coleção de quadrinhas populares das que se cantam no interior da província, quando a viola passa de mão em mão”. 
Seguindo alguns registros sobre o assunto, de forma cronológica, mais de uma vez João Cezimbra Jacques, fez alusão a este instrumento em seu “Ensaios sobre os costumes do Rio Grande do Sul, editado em 1883) quando focaliza “antigas danças”, como por exemplo : “acabado isto cantava o tocador da viola : 

O anú é pássaro preto 
Passarinho de verão 
Quando canta a meia noite 
Dá uma dor no coração”. 

Ainda esse escritor observa : “convém contar-se que até a viola não ficou isenta das alterações determinadas pelo progresso; é assim que ela vai pouco a pouco desaparecendo e sendo substituída pela gaita, instrumento este não tão harmonioso como o primeiro, uma que é muito mais fácil para tocar-se. 
Ainda falando da viola : “parece que com ela vão desaparecendo os cantos em desafio, para os quais se prestava esse instrumento”. 
Lúcio Cidade, no Anuário de Graciano Azambuja (1893) focaliza também a substituição da viola pela gaita, que se “não morreu de todo, agoniza”. 


Já em 1905, Alcides Maya, em sua “Ruína Viva”, deixa-nos esta interessante passagem : “Saracoteava-se alí desenfreadamente, ao som de duas violas e de uma cordeona alternadamente. À última acompanhava-o um mulato, a soprar, de bochechas túmidas, uma carona enrolada. Não era o primitivo fandango dos gaúchos, ardente mas ingênuo, na graça pura aos conceitos singelos das tiranas e da chimarrita : legitimo bochincho, baile bragado, dançava quem queria, havia de tudo, quebrava-se com lascívia. Preferiam-se marcas das cidades : valsas, schottisch, havaneiras”. 

Na mais bela lenda do folclore gaúcho – Salamanca do Jarau – que a riqueza da pena de Simões Lopes Neto transportou para as páginas de sua “Lendas do Sul” (1909), lá vamos encontrar Blau Nunes passando por 7 provas ou tentações, sendo que a segunda delas, que uma “velha carquincha” (teiniagua) lhe ofereceu era “tocar viola e cantar ... amarrando nas cordas dela o coração das mulheres que te escutarem”... 

Cezimbra Jacques em 1912 volta com outra obra, “Assuntos do Rio Grande do Sul – na qual focalizando a viola nos diz: “O motivo do abandono da viola na nossa campanha uns atribuem à invasão de outros instrumentos dentro dela e outros à péssima qualidade das cordas de arame próprias para encordoar esse instrumento, as quais apareciam ultimamente no comércio, sendo tão fracas que não resistiam a uma afinação sem se romperem. 

Porém hoje, apareceram as resistentes e sonoras cordas “verde-gaz” que, sendo próprias para guitarra, prestam-se também para “viola”, parecendo não haver mais motivo para que os nossos dignos compatriotas, habitantes das campinas, desprezem esse instrumento, que não só presta para ser tangido pelas unhas do polegar e, arrancando-lhe , dele, assim sons melodiosissimos, como cantante; prestando-se também para acompanhamentos, como o violão”. 

A gaita matou a viola 
O fósforo o esqueiro 
A bombacha o cheripa 
E a moda o uso campeiro 

Ainda esta quadrinha do nosso populário parece exemplificar bem a transição instrumental por que passou a querência no fim do século passado aos primeiros anos da atual, e que trouxe profundas modificações nas características da música riograndense. Um outro documento, que julgamos hoje de maior importância é o que nos proporcionou o italiano Saverio Leonetti, aqui estabelecido nos primórdios deste século com a Casa Comercial. A ELECTRICA, localizada , na época a Rua dos Andradas no. 302, em Porto Alegre, e que além de se dedicar ao comércio dos brinquedos e artigos elétricos, criou e desenvolveu a indústria do disco – implantando – pioneiramente, em nosso estado, a fabricação, dos famosos Disco GAÚCHO 

‘Savério Leonetti era também o único fabricante dos afamados gramophones marca “A Electrica” e a casa mantinha o maior sortimento de artigos phonográficos no Estado, segundo publicação da época. 
Pois à Avenida Sergipe no. 9, instalou esse comerciante estrangeiro a sua fábrica e de onde saiam os “discos gravados especialmente para a casa “A ELECTRICA”. Assim ganharam eles coxilhas, canhadas para alegrar os lares das nossas estâncias, os ranchos gaúchos, e festas galponeiras. 
As chapas – como eram chamado os discos antigamente – continham inúmeras composições, tradicionais já na época, instrumentistas da terra, gente que começa a sua vida artística no setor discográfico do Rio Grande. 
E entre centenas de músicas gravadas por dezenas de músicos do Rio Grande do Sul, lá vamos encontrar estes “Cantos gaúchos com acompanhamento de gaita, violão e viola” : 

536 – Trovas Gaúchas 
537 – Boi Barroso 
538 – Reis Camponezes 
53 - Desafio de Trovas 
561 – O Anú 
563 – Lembrança do Morro Negro 
755 – Morena Gaúcha 
718 – Encontro de dois Gaúchos 
719 – Trovas do Boi Barroso 
737 – A Chegada dos 3 Reis 
758 – Trovas dos assobios 
761 – Serenata Camponeza 
738 – A Retirada da Quinca 


Podemos afirmar, que estas composições contém os mais antigos registros de som de viola, na música riograndense. 

ESCLARECIMENTO : 

Os mais destacados tipos de violas portuguesas : 
Viola Bragueza (de Braga) – algo menor que a guitarra espanhola comum. Tem seis cordas duplas, dez trastes. Boca ovaladas. 
Viola Madeirense Cintura mui pronunciada. Seis cordas duplas, treze trastes. 
Viola Michelense – Forma e tamanho da guitarra espanhola comum. Seis cordas duplas. 
Viola Açoriana – instrumento semelhante ao violão (viola francesa) mas que tem somente cinco ordens de cordas (mi, si, sol, ré e lá); as primas ou primeiras (mi) e as segundas (si) dobradas; as terceiras ou toeiras (sol), compõem-se de um bordão e de uma corda de arame, oitava deste. Os restantes bordões ré e (lá) são acompanhados de mais duas cordas também oitavas. Antigamente as terceiras, ou toeiras, e uma de cada bordão de arame amarelo. 

Sabendo os efeitos maravilhosos que ocasiona a música entre os índios, os padres dedicaram-se especial atenção a essiná-la aos silvícolas. “Desta maneira se formou, em cada povo, uma capela de quarenta músicos, com todos os instrumentos os mais sonoros conhecidos na mesma Europa, como harpa, cornetas, órgão , violas, citaras, alaúdes, rabecão, fagote, etc., cujos instrumentos não só tocam aqueles índios, como também os nativos. 

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Se eu tivesse a oportunidade de realizar o desejo de ter uma vida perfeita, a tentação seria grande mas eu teria de recusar, porque a vida não me ensinaria mais coisa alguma.”
Allyson Jones